Celibato e retenção seminal: o que especialistas dizem sobre as práticas adotadas por Léo Picon

Consequências podem envolver dor crônica, disfunção sexual e maior irritabilidade

Celibato e retenção seminal: o que especialistas dizem sobre as práticas adotadas por Léo Picon

Em janeiro, o influenciador Léo Picon compartilhou com seus seguidores nas redes sociais que tomou a decisão de entrar em um celibato, ou seja, se abster de relações sexuais.

Segundo ele, a decisão veio depois de ler sobre possíveis benefícios da retenção seminal, que é a prática de evitar a ejaculação – o homem deixa de se masturbar, de fazer sexo, ou de alcançar o orgasmo quando tem uma relação.

Para entender os impactos do celibato e da retenção seminal para a saúde, o gshow ouviu o médico José Alexandre Araújo, especialista em urologia e urologia feminina do Instituto Maieve Corralo

 

Celibato e retenção seminal podem trazer benefícios?

 

A escolha por um celibato é individual e deve ser respeitada, mas é importante observar os impactos que a abstinência sexual pode causar na saúde masculina. De acordo com o especialista, o celibato pode causar mais inquietude, ansiedade e falta de concentração na atividades do dia a dia por uma maior irritabilidade.

O médico explica que, além de não ter benefícios, homens que evitam se masturbar, ter relações sexuais e ejacular podem enfrentar problemas quando decidirem retomar esses hábitos.

 

"Ter ereção ajuda a ter mais ereção, ou seja, se o paciente se mantiver sem sexo num movimento para baixar a libido de forma mental, evitando assim ter mais ereções, pode ser que no futuro, quando decidir voltar a ter relação sexual, ele tenha muitas dificuldades. E não só dificuldade psicogênica, dificuldade da parte fisiológica funcional, porque é como se o pênis dele estivesse 'atrofiando', deixando de funcionar por falta de atividade literalmente. Então, atividade sexual é saúde física e mental”.

 

O interesse por sexo cresce com o aumento da prática sexual? Entenda se o hábito de transar está ligado à libido — Foto: Freepik

O interesse por sexo cresce com o aumento da prática sexual? Entenda se o hábito de transar está ligado à libido — Foto: Freepik

Ao gshow, o cirurgião cardíaco e palestrante Edmo Atique Gabriel explica que a importância da atividade sexual para uma vida saudável vai muito além do bem-estar.

"Sem dúvida nenhuma, o ato sexual tem uma capacidade de liberar hormônios de alívio, hormônios de bem-estar (endorfinas, dopamina e serotonina), os quais são muito importantes para o equilíbrio da função cardíaca. (...) O prazer e o alívio que ele dá fazem parte realmente da regulação de todas as nossas atividades metabólicas".

O médico alerta, ainda, que longos períodos de abstinência ou de retenção do orgasmo podem gerar um estresse físico e mental que coloca o coração em risco.

 

"Se a pessoa começa a adotar esse hábito de controlar a ejaculação com muita frequência, quase toda semana, e fica convivendo com o nível de ansiedade que isso gera, fica convivendo com esse nível de frustração que isso pode gerar, fica convivendo com essa questão da liberação incompleta dos hormônios, com uma sensação incompleta de bem-estar. Ela vai gerar um estresse físico interno desnecessário que vai comprometer também a sua saúde emocional e isso, como qualquer situação de estresse, pode levar a uma doença cardíaca como infarto".

 

 

Por que alguns homens querem parar de se masturbar?

 

A adoção do celibato e da prática da retenção seminal estão relacionadas ao no fap, um movimento que vê a masturbação como uma prática prejudicial e que deve ser evitada.

Em buscas pelo termo, é comum encontrar relatos de homens jovens que escolheram adotar esse estilo de vida por considerar que seus hábitos de masturbação e consumo de pornografia são nocivos, e alguns se referem a eles como um "vício".

Ao gshow, o sexólogo Mahmoud Baydoun, mestre em psicologia e doutorando em sexualidade humana na Widener University (EUA), explica que não existe vício em masturbação uma vez que se trata de um comportamento natural não só do ser humano, mas também de outras espécies, e que não pode ser comparado a uma substância psicoativa que causa dependência química.

O sexólogo destaca, ainda, que o que muitos podem considerar erroneamente como vício na verdade tem um outro nome dentro da Classificação Internacional de Doenças (CID): o comportamento sexual compulsivo, também chamado de compulsão sexual, registrado com o código CID-11: HA02.

Celibato: quais os efeitos? — Foto: BSIP/Universal Images Group

Celibato: quais os efeitos? — Foto: BSIP/Universal Images Group

"[O diagnóstico] pode englobar atos sexuais, pode englobar masturbação e pode englobar uso de pornografia. Então, a pessoa assiste e não consegue parar, continua assistindo. Mas o problema não é o sexo, não é a masturbação, não é o ato em si, não é o que ela está fazendo, é o sentimento por trás. (...)".

Dessa forma, o profissional explica que focar na repressão ou privação de estímulos não ajuda e pode levar o comportamento compulsivo para outras áreas da vida: diante da proibição da pornografia ou da masturbação, a pessoa pode passar a comer, usar drogas ou fazer compras compulsivamente.

 

"Existem muitos relatos na literatura sobre como uma compulsão pode se transferir de uma área para outra. Isso geralmente acontece quando a pessoa está assistindo, ou fazendo sexo, ou se masturbando, mas na verdade a necessidade dela é outra. Vamos supor, a pessoa está sentindo necessidade de afeto, aí ela vai lá e se masturba, ou entra no filme pornô, ou come um chocolate. Ela não vai satisfazer a necessidade, então ela vai começar a fazer isso várias vezes", destaca.

 

Para entender qual sentimento ou necessidade está motivando a busca pela masturbação ou pornografia, Mahmoud Baydoun diz que uma ferramenta útil é um exercício chamado HALT (sigla em inglês paras palavras faminto, bravo, solitário e cansado) que funciona como um check-up das emoções.

O sexólogo adiciona o orgasmo à lista de necessidades que devem ser observadas e destaca que o sexo não pode ser considerado um problema: "É uma necessidade humana, ela nasce com a gente. A gente não pode demonizar algo que é humano e, na verdade, não é humano, é de todas as espécies de animais".

 

"Estou com fome e preciso comer? Estou cansado e preciso descansar? Estou me sentindo sozinho e preciso de companhia? Estou com raiva e preciso desestressar? Estou sentindo tesão e preciso gozar? Se a resposta for 'estou sentindo tesão e preciso gozar' e eu me masturbar provavelmente não vai ter problema nenhum porque você vai conseguir satisfazer sua necessidade. Mas quando você procura isso para satisfazer outra necessidade é aí que [se torna uma questão]".

 

Mahmoud Baydoun destaca que, em sua experiência, os casos de compulsão são uma minoria entre os que procuram ajuda por conta do uso de pornografia ou pela masturbação. Para ele, a maioria das pessoas vive um conflito moral motivado por uma educação sexual repressora (e que vê o sexo de forma negativa) ou crenças religiosas.

"Pessoas que tiveram uma educação sexo-negativa são mais suscetíveis a desenvolver problemas sexuais, de relacionamento e de disfunções sexuais. Um grande exemplo disso é o vaginismo [disfunção que causa contrações involuntárias dolorosas na região da vagina, dificultando ou até impedindo uma penetração]. Geralmente em pacientes com vaginismo a gente vê que muitas tiveram uma educação sexual rígida".

O diagnóstico de compulsão sexual é feito por um profissional da saúde mental, psicólogo ou psiquiatra, que deve ser procurado se as práticas sexuais começam a fugir de contexto (quando usadas para atender outras necessidades), a atrapalhar outros aspectos da vida e a gerar sofrimento pessoal, que parte do próprio indivíduo e não do julgamento de outras pessoas.

 

Fonte: https://gshow.globo.com/comportamento/saude/noticia/celibato-e-retencao-seminal-o-que-especialistas-dizem-sobre-as-praticas-adotadas-por-leo-picon.ghtml