Opinião | Carlos Bernardo: O que seria do Brasil sem a esquerda?
Por Carlos Bernardo (*)
Imaginar um mundo — e especialmente um Brasil — sem a esquerda é imaginar um país menos democrático, mais desigual e totalmente subordinado aos interesses de poucos. A esquerda, ao longo da história, foi a força que impediu que a sociedade brasileira fosse dominada exclusivamente pela lógica do lucro acima da vida.
Sem a esquerda, direitos que hoje parecem naturais jamais teriam existido. A jornada de trabalho de oito horas, as férias remuneradas, o salário mínimo, o 13º, a aposentadoria, a proteção à maternidade e até a regulamentação básica das relações trabalhistas nasceram da pressão e da luta dos movimentos sociais e sindicatos progressistas. A inexistência da esquerda significaria entregar o trabalhador às regras impostas pelo mercado, onde o forte sempre vence e o fraco se torna descartável.
O Brasil sem esquerda também seria um país onde a fome e a miséria não são problemas públicos, mas “falhas individuais”. Programas sociais como o Bolsa Família, o PAA, a Farmácia Popular, o Luz Para Todos e tantas políticas de inclusão que tiraram milhões da pobreza simplesmente não existiriam. O Estado deixaria de ter compromisso com os mais vulneráveis, e a desigualdade — já brutal — seria ainda mais cruel.
No campo dos direitos civis, o retrocesso seria inevitável. Sem a esquerda, mulheres, negros, povos indígenas e outras minorias jamais teriam conquistado espaço político, acesso à educação superior ou proteção legal contra discriminações históricas. A igualdade, hoje consolidada na Constituição, seria uma promessa vazia nas mãos de grupos que sempre resistiram ao avanço social.
Mesmo setores tradicionalmente considerados conservadores, como o agronegócio — setor do qual faço parte — seriam duramente afetados. Foi na gestão de governos progressistas que o crédito rural se ampliou, que a agricultura familiar recebeu apoio estruturado, que a logística de exportação avançou e que políticas de garantia de preços e de estímulo ao pequeno produtor foram fortalecidas. Um Brasil sem esquerda seria um ambiente onde pequenos e médios agricultores voltariam a ser engolidos pelos grandes monopólios.
E talvez o ponto mais perigoso: sem a esquerda, a democracia brasileira perderia seu equilíbrio. A crítica ao poder, o debate público, a contestação aos privilégios e a defesa da pluralidade desapareceriam. O autoritarismo — sempre à espreita — encontraria terreno fértil. A história já mostrou mais de uma vez: onde há pensamento único, há retrocesso.
O Brasil precisa da esquerda não por ideologia, mas por necessidade histórica. Para garantir direitos. Para combater desigualdades. Para equilibrar o jogo político. Para que o país avance sem abandonar quem está atrás. A esquerda é o freio dos abusos e, ao mesmo tempo, o motor das transformações que fazem o Brasil crescer de forma mais humana e mais justa.
Sem ela, o futuro deixaria de ser um projeto coletivo e voltaria a ser a propriedade privada de uma minoria privilegiada.



